Profº MsC. MÁRCIO BALBINO CAVALCANTE. Geógrafo - UEPB; Mestre em Geografia - UFRN e Especialista em Ciências Ambientais - FIP. - Cidade: João Pessoa, Paraiba - Brasil E-mail: marcio-balbino@hotmail.com SEJA BEM VINDO !!!
Domingo, 13 de Setembro de 2009
A GEOGRAFIA E A IMPORTÂNCIA DO COTIDIANO PARA A EDUCAÇÃO AMBIENTAL NO ENSINO FUNDAMENTAL

Márcio Balbino Cavalcante

 

Nos primeiros anos de escolaridade a preocupação com o tipo de aprendizagem que a criança tem é constante, pois os primeiros estágios de desenvolvimento cognitivo e as oportunidades para que a apropriação do conhecimento aconteça numa perspectiva de totalidade, torna-se muito importante, e neste andar, os conhecimentos prévios, as experiências vividas, valores e atitudes devem ser valorizados no processo educativo. Ao chegar à escola as crianças vem com uma bagagem construída através dos seus laços afetivos que formam seu cotidiano, isto é, chegam com uma carga de informações que não podem ser descartadas, ampliando sua visão de mundo, sem jogar fora a maneira de como está acostumada a ver esse mundo, de forma contínua, sem fragmentações.

Assim, a estrutura do comportamento vai se alterando, surgem novas maneiras de ler o mundo, as necessidades também vão mudando, as expectativas são outras, e os entendimentos das relações dirigem-se para um caráter mais abstrato, elaborando-se para o ato de pensar, para as crianças, pensar significa lembrar; no entanto para o adolescente lembrar significa pensar (VIGOTSKY, 1999).
Conforme vão crescendo, as crianças dão significados ao que vivem, percebendo as influências que acontecem na relação com o ambiente e com suas vivências, apropriam-se dos conhecimentos e habilidades. Estabelecendo relações espaço-temporais para chegar a outros planos, na busca de autonomia.
A criança é o sujeito deste processo e a partir desta fase constrói por si alguns valores e se espelha nas pessoas que o cercam para descobrir outros significados. O conhecimento é construído num complexo de interações com o meio físico e social promovido pelas atividades desenvolvidas e relações com toda a comunidade escolar no seu espaço vivido.

A importância do cotidiano no ensino de geografia

É no ensino fundamental que se deve oportunizar situações para os conhecimentos básicos, de maneira simples, criar um relacionamento de cumplicidade, através dos sentimentos, promover a reflexão sobre as ações, preservar o interesse e aproveitar as oportunidades criadas durante os trabalhos realizados em sala de aula e fora dela, para refletir sobre os conhecimentos globais e relacionar com o local, e nesta oportunidade, tentar identificar a subjetividade que está na cotidianidade. Com essa dinâmica, mais indagações surgem e encaminham novas atividades, estimulando novas descobertas.
O dia-a-dia dessas crianças é recheado de situações que acontecem em lugares, explica o geógrafo Milton Santos (1996), “cada localização é, pois, um momento do imenso movimento do mundo, apreendido em um ponto geográfico, um lugar. Por isso mesmo, cada lugar está sempre mudando de significação, graças ao movimento social: a cada instante as frações da sociedade que lhe cabem não são as mesmas”, os seus lugares, que possuem características próprias, com movimentos construídos por sujeitos ansiosos, e a procura de novas informações para resolver os problemas que lhe são imediatos e os atingem. Na vida dos alunos há um “espaço de vida cotidiano” demarcado por lugares fixos: casa-escola, interligados por itinerários. (FOUCHER, 2002).
Neste “espaço” é onde acontecem as interações que os alunos vêem como importantes, e é daí que se baseiam para compreensão do mundo. Para sanar dúvidas, entender o espaço e as relações atuais, buscam a compreensão na geografia. Nela as experiências educacionais tornam-se concretas porque estão inseridas na vida de cada um. Os gestos, as atitudes acontecem no “lugar-casa”, “lugar-escola”, “lugar-bairro” e assim por diante.
Na busca de um ensino de qualidade, e tentando eliminar a dicotomia entre teoria e prática a geografia proporciona a reflexão sobre a realidade podendo extrapolar algumas regras do ensino tradicional que funciona com horários e locais determinados, percebendo que o cotidiano dos alunos é vivido além das quatro paredes da sala de aula, descobrindo que pertencem a um conjunto de lugares e pessoas que influenciam no seu cotidiano, entendendo também que “significa geografizar esta noção de cotidiano que os geógrafos freqüentemente incorporam a partir da Sociologia, quando é possível fazê-lo a partir do próprio espaço, ou seja, da geografia, o que nos permitiria enriquecer os enfoques sociológicos” (SANTOS, 1996).
A aprendizagem da geografia nesta idade escolar tem uma dinâmica própria, com muito interesse por parte dos alunos, que sentem prazer pela descoberta, têm muita curiosidade, e principalmente aos assuntos ligados a “natureza”, em que as crianças têm contato direto, procurando conhecer o espaço, tentando entender as relações que ocorrem, olhando os detalhes que estão a sua volta, buscando um sentido para cada momento, nos acontecimentos, em cada ato. É neste momento que o professor da educação básica tem a tarefa de oferecer situações nas quais de forma participativa, com trabalhos em equipes, possam adquirir o conhecimento e ao desenvolver as habilidades, também permitem a organização deste conhecimento.
Nesta etapa, o trabalho realizado no concreto, acompanhando as atitudes que acontecem no dia-a-dia, proporciona o estudo dos conceitos, e o avanço no entendimento do local, da paisagem, compreendendo o funcionamento do modo de produção despertando para o processo de cooperação, onde as trocas de idéias e de experiências surgem dando autonomia crítica sobre o que acontece.

O cotidiano, a Geografia e a Educação Ambiental

É neste momento, que a geografia busca aliados que se entrosem e valorizem o cotidiano das crianças, como uma alternativa para a preparação de cidadãos que saibam lidar com a questão ambiental e perceber, que desde pequenos, pode-se mudar a concepção posta em questão, pois Santos (1996), diz que o cotidiano está estruturado a partir do homem como “dimensão da corporeidade, dimensão da individualidade e a dimensão da sociabilidade”, que fazem parte do espaço possuindo significações determinantes no contexto social.
É no andar de cada dia que vejo um caminho para a conscientização e sensibilização pautada nas relações com o ambiente, sendo incorporado pelos alunos demonstrando o tempo todo, através das suas atitudes que TUAN (2000) diz: “Atitude é primariamente uma postura cultural, uma posição tomada frente ao mundo”, e com seus sentimentos, valorizam o seu “habitat”, tornando “lei”, tudo que seus pais, amigos e professores contam sobre a sua realidade. Com essa postura perante o seu lugar, cria-se a possibilidade de dialogar sobre valores e comportamentos surgidos na sua rotina. É na dimensão da vida dos alunos que a educação ambiental vem contribuir, sem se limitar a pequenos temas.
Ao trabalhar com educação ambiental de forma compartimentada, ou com assuntos que estão em voga, como temas estritamente ecológicos, o tema qualidade ambiental não se reduz à abordagem realizada pela área das Ciências Naturais. Ela é muito mais ampla e deve ser estudada também pelas Ciências Humanas, mesmo porque a degradação ambiental é um processo de ordem social tanto na sua produção quanto nas conseqüências e seqüelas que se fazem sentir e/ou repercutem na sociedade. E são também nela, na sociedade, que se organizam os movimentos populares que propugnam a melhoria das condições de vida, do contrário, os objetivos não serão alcançados e a sociedade continuará devastando direta e indiretamente o planeta, sem saber realmente como isso aconteceu. Cabe trabalhar de uma forma interdisciplinar, não apenas “conectando” as disciplinas, buscando com o aluno, na sua vida, a investigação sobre o que interessa, ou necessita, puxando o diálogo, tornando a discussão cada vez mais rica, consolidando uma relação que levará às ações desejadas.
Se a educação for encaminhada dessa forma, a busca para pesquisar outros fatores do meio social fará com avancem e que todos fiquem atentos para realizar melhorias e criar condições de preservar e conservar o ambiente durante o processo da pesquisa, e depois dela. Criando condições para ter mais intimidade, o envolvimento com a pesquisa mostrará a situação da realidade, se estendendo ainda mais, motivando outros assuntos para discutir e detectar problemas, levando a perceber que há necessidade de explorar outros conteúdos relevantes às pessoas da comunidade.
A experiência do viver dá o suporte para que os conteúdos curriculares se tornem cada vez mais ricos e diversificados, também tornando as aulas atrativas, prazerosas e os alunos ávidos para a descoberta. A espontaneidade, viva, esplêndida nas crianças, que se manifesta em momentos inesperados, não pode passar despercebida, pois a “espontaneidade que é característica da cotidianidade.” (HELLER, 2002). Isso surge quando os alunos colocam o que sentem o que vêem, quais são os cheiros, cores, gestos e atos que podem surpreender a todos podendo alertando para novas idéias, levando-os a refletir sobre sua prática diária.
No dia-a-dia, outros fatores como o consumismo aparecem, como conseqüência de um sistema que está posto, estimulado por todos os meios, elaborando padrões de consumo, motivam a criação de materiais  que  incentivam e impulsionam a degradação, passam, despercebidos.  Pior ainda, são estimulados primeiramente através das crianças, como bem útil e agradável, fazendo com que não se contenham envolvidos pelo prazer, nem percebem que junto ao produto acompanha algo que prejudicará o seu meio, a sua vida. Se a educação ambiental se fizer presente, neste momento, com suas orientações, as crianças terão outra concepção, agirão na natureza e tratarão suas relações com outros objetivos, e sua interação com o planeta será honesta e verdadeira.

Conclusão

A prática pedagógica da geografia permite trabalhar com os recursos naturais, sua ligação com a sociedade, numa dinâmica que a Educação Ambiental possa abraçar outras disciplinas considerando não apenas os espaços naturais como referência para as atividades. Ultrapassando a tendência de trabalhar somente com temas específicos, partimos para o trabalho de entendimento sobre as causas, conseqüências, e que tipo de relações econômicas e culturais há entre a humanidade e a natureza que está desencadeando esta situação. Ainda, que procedimentos devem ser adotados, com as plantas e animais, formas de preservação, conservação e recuperação do ambiente, sem separar o meio físico dos outros seres vivos.
Entender o ambiente como um todo, com um olhar para uma estrutura articulada e integrada, trabalhar a questão da consciência e sensibilização, aprofundar o conhecimento, enfatizar o trabalho com as atitudes e habilidades, bem como, chamar todos para a participação.  
Com estas condições a educação ambiental não afasta as especificidades da geografia e das outras disciplinas, pelo contrário, tem a oportunidade de aprofundar os conceitos com empenho e o compromisso de resgatar as manifestações dos alunos e convidá-los para pensar e agir sobre as adversidades que poderão encontrar.
Não querendo simplificar, nem cair no reducionismo, insisto na atenção e valorização das ações coletivas, e a perspicácia de observar e perceber os fatores do cotidiano dos alunos, observando a integração, os movimentos que ali acontecem e que devem servir como exemplo, alternativa e estratégia educacional, estimulando as crianças, a entender o seu “espaço”, formando um cidadão que conhece o ambiente do seu lugar.

HELLER, Agnes. Para mudar a vida: felicidade, liberdade e democracia. São Paulo: Brasiliense, 2002.
LUCKESI, Cipriano Carlos.  Filosofia da Educação. São Paulo: Cortez, 1994.
REIGOTA, Marcos. A Floresta e a Escola: por uma educação ambiental pós-Moderna. São Paulo: Cortez, 1999.
SANTOS, Milton.  Espaço e Método. São Paulo: Nobel, 1996.
TUAN, Yi-Fu. Topofilia: Um estudo da percepção, atitudes e valores do meio Ambiente. São Paulo: Difel, 2000.
FOUCHER, Michel. A Geografia, Apesar de Tudo. In: VESENTINI, José William. Geografia e Ensino: textos críticos. 2a ed. Campinas, São Paulo: Papirus, 2002.
VYGOTSKI, L.S. A Formação Social da Mente – O desenvolvimento dos Processos Psicológicos Superiores. São Paulo: Ed. Martins Fontes, 1999.

Publicado em 23/03/2009 12:40:00


Márcio Balbino Cavalcante - Professor e Consultor na área de Educação e de Meio Ambiente. É graduado em Geografia - UEPB; Pós-graduado  em Ciências Ambientais - FIP/PB; Coordenador de Projetos Educacionais da Secretaria Municipal de Educação do município de Passa e Fica - RN. Professor de Geografia na Escola Estadual Sen. João Câmara, Passa e Fica - RN.



Publicado por Profº Márcio Balbino Cavalcante às 01:32
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